Que Grande Seca

Estamos em seca e, acabada a campanha eleitoral e as eleições, os telejornais dedicam-se a informar-nos da gravidade da situação. Há pouca água e, caso não chova entretanto e com persistência, teremos um período estival complicado.

Na região tem sido notícia os níveis da Barragem do Vilar, mais a norte, com níveis anormalmente baixos. Também todos deverão recordar o que aconteceu em 2017 na Barragem de Fagilde, reservatório onde é captada a água para consumo humano e industrial para os concelhos de Viseu, Mangualde, Nelas e Penalva do Castelo, onde foi montada uma operação com recurso a camiões cisterna, maioritariamente de bombeiros, para tentar repor os níveis mínimos de água na albufeira (?), enquanto o nosso astro rei se deliciava a faze-la evaporar.

Começam a surgir apelos das mais diversas entidades à poupança e uso racional da água, coisa que deveríamos fazer sempre.

Nos últimos anos foi forte o investimento feito pelo Estado, maioritariamente com recurso a fundos comunitários, no chamado “círculo urbano da água”, para dotar as comunidades de infra-estruturas que melhor tratem e armazenem este bem essencial, tão presente e tão escasso, tão essencial e tão desperdiçado.

No pedaço de território onde habito – a União dos Concelhos de Canas de Senhorim e Nelas, desde 2017, foram aprovadas pelo POSEUR/Portugal2020, investimentos de mais de 8 milhões de euros que corresponderam a um financiamento comunitário de mais de 6,6 milhões de euros. Investimentos que visavam a construção de várias ETAR, redes de abastecimento e drenagem, ou construção de depósitos. No meio destas obras aprovadas está a emblemática (apresentada até como o “rolls royce” das ETAR pelo anterior presidente de Câmara) ETAR Nelas III, alvo de um investimento de mais de 3 milhões de euros e com um projecto acessório de quase 1.4 milhões de euros para “reutilização de águas residuais tratadas”. 4,4 milhões de euros dos nossos impostos, 856 mil euros dos quais componente nacional assegurada pela Câmara da União dos Concelhos de Canas de Senhorim e Nelas, para tratar e reforçar a disponibilidade de água.

Também a triste sina da Ribeira da Pantanha, que ao longo de mais de uma década foi transformada que foi em canal de esgoto sem adequado tratamento, desaguando no mondego um líquido cheio de químicos e espuma, provocando danos ambientais inqualificáveis naquele curso de água, é conhecida de quase todos. O princípio do utilizador/poluidor - pagador só serve por estes dias aparentemente para quem utiliza auto-estradas.

Com a construção da ETAR Nelas III, financiada a 85%, supostamente todo este drama ambiental, que se agrava quando a disponibilidade de água a montante, como é o caso actual, é menor, deveria terminar. Um “rolls royce” caro e “eficiente” deveria tratar cabalmente todos os esgotos, industriais e urbanos e rejeitar água no meio hídrico em perfeitas condições, já não na Ribeira da Pantanha, afluente do Mondego, mas na Ribeira de Travássos/Beijós, afluente do Dão. Deveria só que não.

São recorrentes os relatos de uma ribeira cheia de espuma e ainda neste fim-de-semana, foi observável mais um episódio de poluição na localidade de Beijós.

Veja-se o vídeo gravado no transacto fim-de-semana e, ignorante ou não destas questões, tirem-se as conclusões que, face ao que é visível (e é recorrente) não podem ser muitas.

Como é possível tolerarmos décadas deste desrespeito ambiental? Como é possível enquanto sociedade afectarmos milhões de euros para “resolver” problemas e, quando os resultados são os visíveis, não haver responsabilização por quem decide/projecta/executa/opera, projectos que não servem para resolver os problemas deviam resolver? Ou essa parte é chata, uma grande seca, e não vale a pena chatearmo-nos enquanto sociedade? Será que podemos tolerar amadorismos que para poupar uns tostões nos trazem estas consequências?

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Representatividade

Dia 30 de Janeiro vamos a votos e é bom que todos os que possam, vão votar. Em 2019, nas últimas legislativas, dos 348 mil inscritos no círculo eleitoral de Viseu apenas 51% dos eleitores (177 mil) se deu a esse “trabalho”. A nível nacional, excluindo a emigração, fomos apenas 54%. Bem sei que os cadernos eleitorais enfermam de problemas, mas, ainda assim, a participação eleitoral é ridícula e não devia ser, a bem da democracia e da sua defesa. 

Muitas razões haverá para este cada vez maior alheamento e não faltam, imediatamente antes e após as eleições, proclamações políticas a manifestar preocupação com ele. Normalmente são efémeras e só ressuscitam na campanha eleitoral vindoura. Vamos, paulatinamente, escavando o fosso que afasta eleitores e eleitos e lançando à terra as sementes de populismos e extremismos. 

Nas últimas legislativas Viseu perdeu um deputado, resultado da perda de população, que é, também, resultado do centralismo. Votamos, nós e grande parte do país, num círculo vicioso que, desta forma não será vencido nunca. No futuro o interior terá cada vez menos população (a própria Ministra da Coesão admitiu em entrevista ao Público que “há partes de Portugal onde não se vai “recuperar população” e economia) e, isso retirará representatividade e diversidade política a grande parte do território e às pessoas que ai vivem. Esta cada vez maior possibilidade de representação trará, concomitantemente, o afastamento de mais eleitores das mesas de voto. 

Haverá várias formas de tentar mitigar este problema, mas, na verdade, são poucas as propostas e os esforços para o atingir. 

As autarquias têm há muito um instrumento que tenta atenuar os desequilíbrios territoriais a nível financeiro – o Fundo de Equilíbrio Financeiro (FEF), havendo municípios que contribuem para outros receberem. Não fará sentido aplicar ao sistema eleitoral, nas legislativas ao menos, um mecanismo semelhante de compensação, para que não haja parcelas do território que quase não elegem ninguém (Portalegre elege dois deputados, Guarda, Beja e Évora apenas três) enquanto Porto e Lisboa elegem 40% dos deputados?). 

Não fará sentido equacionar a possibilidade de haver um círculo nacional que agregue todos os votos que nos vinte e dois círculos distritais não elegeram qualquer deputado, numa primeira ronda? Um círculo que valha 10 ou 20% (?) dos eleitos e que diminua a enorme possibilidade de um voto num destes círculos seja simplesmente deitado ao lixo e, portanto, a vontade desse cidadão totalmente desconsiderada? 

Se estivermos realmente preocupados com a democracia, com a representatividade, no país da “disciplina de voto” para quase tudo, alguma coisa terá de ser feita. Isto se quisermos aumentar a participação política, nas eleições e fora delas, e, democraticamente, dar vós e palco a mais e mais população. 



Em Viseu, por exemplo, nas últimas legislativas, foram 41.746 os votos que foram para o “lixo”, 25% dos depositados em urna, 33% dos que serviram para eleger deputados. A estes podemos ainda somar 7.695 votos brancos ou nulos. São praticamente 50 mil votos que, expressos, não contam para nada. É possível ter mais respeito pela vontade de todos e pela democracia. É possível valorizar a actividade política, a sua seriedade, educar para a cidadania, cortar nos paliativos futebolisticos (e outros) que deliberadamente (?) nos entontecem, no fundo tratar de assegurar um sociedade madura e o nosso futuro.

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Decência Democrática

As autárquicas foram no transacto 26 de Setembro e, na União dos Concelhos de Canas de Senhorim e Nelas, muitos foram os que ficaram surpreendidos com a derrota da candidatura que ostentava na lapela o símbolo do Partido Socialista. O maior surpreendido deve ter sido o “socialista”, para o qual a democracia é um jogo que se joga em 12 horas de 4 em 4 anos. Ele que, meses antes, já andava a cantar vitória em diversos fóruns. “Perder eleições é a segunda melhor coisa em democracia, porque é sinal que se concorre”, gracejava na hora da derrota o indivíduo que não respeitava decisões da Câmara a que presidia, como se não precisássemos de respeitar e praticar a democracia todos os dias, ouvindo as opiniões dos cidadãos que a isso estão disponíveis. Já perto das eleições era notório o seu desespero e, a dimensão da sua derrota, sua e de quem insistiu agora e há 4 anos em apoiá-lo, não deixa margem para dúvidas. 

A dimensão do desastre do que foram os seus mandatos só agora será conhecido (se alguma vez o será em toda a sua plenitude), que a propaganda não é a realidade. Já em 2017, após 4 anos de exercício presidencial e antes da reeleição, eram mais do que notórias as evidências de uma gestão atabalhoada, os tiques ditatoriais e a má educação intolerável, que deveria levar a qualquer cidadão, com ou sem responsabilidades, a descartar o apoio a tal personagem. 

É especialmente elucidativa da forma de governo que se instituiu em Nelas o que aconteceu logo após às eleições e à derrota do PS, uma governação que aparentemente e  nos bastidores, parecia proceder à transferência desbragada de influência, entre o público e o privado, muitas vezes alegadamente através de um determinado escritório de advogados.

No dia 27, um dia depois, uma advogada, em nome de uma empresa para a qual aparentemente trabalha(va), fez reunir 33 trabalhadores da Covercar, para lhe anunciar que estavam despedidos. Um dia depois das eleições. Certamente que foi uma coincidência e não assistimos a uma deliberada mistura de interesses que deturpa e entorse a democracia. Situação semelhante acontece agora com outra empresa, esta bem mais importante e que está a ser afectada pela crise dos semicondutores, e com a qual o tal escritório já teve(?) uma relação profissional muito próxima, onde agora estão a despedir colaboradores, alguns com 20 anos de dedicação. Este timming, logo após o acto eleitoral, será certamente uma mera coincidência, pensamos todos. Não é?

Este tipo de situações deviam fazer-nos pensar na forma como toleramos as formas de gerir a coisa pública e o risco que pode constituir colocar o que é de todos ao serviço de poucos. Estas coincidências deveriam fazer disparar alarmes e acções para fiscalizar ilegalidades claras que por aí se comentem, que minam o regime e a democracia e que deveriam merecer fiscalização e sanção irrepreensível. Ou colocar uma Câmara a comprar a massa falida de uma empresa do qual o presidente é credor, ou intervir, enquanto presidente, em procedimento administrativo que potencia ganhos imobiliários de 50 mil euros em apenas 4 horas, não serão motivo suficiente?

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Surpresa? ZERO

Hoje no Observador

Infelizmente zero surpresa. Felizmente houve a penalização, para já, devida. 




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A Força que nos Une? O Povo é quem mais Ordena.

Recentemente grandes cartazes garantiam-nos que a força que nos unia, a nós meros cidadãos era a “confiança” e a “esperança”, adjectivos que, para mim (e pelos vistos para a maioria) só faziam sentido para descrever a união dos integrantes das referidas listas. Maioritariamente só os candidatos teriam confiança e esperança em serem eleitos. Olhando para muitas das acções de campanha, nomeadamente para o “grande comício de encerramento” que o PS(?) deu na Escola de Nelas, até é provável que nem neste universo a confiança e a esperança fossem sentimentos que se manifestassem, pois nem estes se deslocaram ao referido evento.

Zeca Afonso postulava que “o Povo é quem mais ordena” e, o povo, ordenou o que se impunha, contra os ditames de meia dúzia de avocadores, que devem achar que a democracia (seja ela a interna ou a externa aos partidos) é um mero artificio para usarem a seu bel-prazer – As listas do OS foram impecavelmente dizimadas no processo eleitoral.

Borges da Silva, mal tomou posse como presidente da Câmara, demonstrou ao que vinha e manifestou que os valores da democracia, legalidade, educação, eram meros artifícios para atirar à cara de outros pois, a ele, imbuído das vestes de presidente, tudo lhe era permitido, ultrapassando todos os limites. Com ele, pouco tempo bastou para manifestar que as regras (legais, de educação, democráticas, etc.) eram coisas importantes, mas só para aplicar aos outros cidadãos, eleitos ou não.


Para quem com ele foi eleito em 2013, todos os seis vereadores, tudo isto foi clarinho com água, tais as tropelias, má educação, prepotência, manifestada dentro e fora das reuniões de Câmara. Não foi por acaso que dos seis vereadores eleitos (3 do PS, 2 do PSD e 1 do CDS) só uma se manteve, impávida e serena, ao lado dele. Lá saberá quais são os valores e as suas prioridades. Todos os outros, sem excepção, lhe retiraram as competências e o acusaram publicamente de não cumprir os mínimos da decência, tentando que a dignidade e a legalidade voltassem a um órgão que sendo o mais representativo do Concelho se impõe que seja digno. Naturalmente, fruto de um desinteresse geral dos cidadãos no dia-a-dia da política, foi mais ou menos fácil para Borges da Silva vitimizar-se e enganar (novamente) o partido e os cidadãos. 

O PS, logo em 2017, manifestou que Borges da Silva não devia ser candidato. Logo em 2017 foram feitas pelo menos duas reuniões de militantes onde, na presença de Borges da Silva, foi explicado a todos os militantes que compareceram (e numa reunião o então presidente até levou uma claque intimidatória de não militantes), bem mais de 50, as razões porque não devia o partido recandidatar Borges da Silva. A maioria da Comissão Política Concelhia deliberou (em voto secreto em urna) não recandidatar o então presidente. Uma parte do partido, legitimamente, optou por ignorar as razões cabalmente explicadas. O processo foi avocado pela distrital e nacional e Borges da Silva foi reeleito. 

Releeito que foi, pouco tempo bastou para, mais uma vez, Borges da Silva demonstrar do que era feito e, os que lhe tinham dado o benefício da dúvida, untados por promessas pessoais e outras, rapidamente viram que tinham sido enganados. 

Não é, portanto, propriamente surpreendente que nesta autárquicas o PS tenha perdido as eleições. Mais uma vez a concelhia do PS, constituída por outros militantes, disse que não o queria e mais uma vez foi desautorizada pela distrital e nacional. Mais uma vez Borges da Silva mostrou toda a sua prepotência e incapacidade de ser humilde e de se colocar, genuinamente, ao lado dos que tem de servir. Surpreendentemente foi, para mim, a expressão da sua derrota. Uma resposta que o povo deu a quem durante oito anos demonstrou que julga que não é o povo que ordena, mas ele próprio. Pois teve a única resposta que tal atitude merece. Resposta que foi endossada a todos os que escolheram ficar ao lado de um poder podre e mal-educado. 

É geralmente atribuída a Lincoln, embora isso pouco interesse, a frase (em inglês naturalmente): “podeis enganar toda a gente durante pouco tempo; podeis enganar algumas pessoas todo o tempo; mas não vos será possível enganar sempre toda a gente”. Para Borges da Silva a balança do engano, seu único modo de agir, desequilibrou-se ao fim de oito anos. Felizmente para o Concelho e para o seu povo agora na Câmara está uma nova equipa, com um presidente bem-educado, desprendido, sem vícios e ligações obscuras, características que podemos atribuir a outros elementos. O mesmo será válido para a maioria das juntas de freguesia, com Canas de Senhorim à cabeça, onde foi possível enterrar um anacronismo hipócrita que, pegando num sentimento legítimo e de amor ingénuo, o transformou num instrumento de poder pessoal que fez definhar aquela que foi durante décadas a localidade mais importante e pujante do Concelho. 

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Circo da Água

Há já bastante tempo que diversas pessoas, entre as quais me incluo, têm alertado para o sério risco de um aumento do preço da "água" depois das próximas eleições. Será que esse risco existe mesmo? E, se sim, qual serão as razões para tal acontecer?

A água é um bem essencial e, para que corra nas torneiras com qualidade, é preciso efectuar investimentos, pagar a pessoas, materiais, etc., e é por isso preciso reflectir o custo nos consumidores finais. Dito isto, há várias formas de cobrar a “água” a quem a consome e tentar equilibrar os custos porque, como todos sabemos, ela é um bem essencial e não pertence propriamente a ninguém sendo, portanto, de todos. 

Quando nos cobram a "água" estão genericamente a cobrar três serviços: a água, propriamente dita, o saneamento (o tratamento dos esgotos para depois rejeição em condições no meio hídrico) e a recolha e tratamento do lixo. 

Para equilibrar contas, racionalizar consumos, protegendo quem não gasta muito e para que ninguém, independentemente dos seus recursos económicos possa ser privado destes bens essenciais, costuma-se organizar os valores cobrados aos consumidores por escalões. Quem consome menos, paga menos por m3. Quem gasta mais, paga mais por m3. Organizam-se então vários escalões (por exemplo quem consome de 1-10 m3 por mês paga um valor, abaixo do preço que custa tratar e distribuir a água, quem consome 10-30 m3, paga um pouco mais, etc.. e quem consome muito, por exemplo 500 mpor dia, paga um valor elevado, maior que o custo, para promover a eficiência ambiental, a poupança dos recursos hídricos e para tornar o sistema sustentável. No caso de Nelas o que temos, para clientes domésticos e outros é o que as imagens documentam.


Estes tarifários são construídos, com os escalões que podem ver, tendo em conta as vendas anuais de água a cada cliente. Agora imaginem que, para beneficiar grandes clientes, daqueles que consomem muita, muita, muita, mas mesmo muita água todos os dias, se arranja uma habilidade e se começa a vender “água não tratada”, proveniente dos aquíferos do Concelho, da Longra, do Areal, por exemplo, e se vendesse essa água a 3 cêntimos o m3. Isso vai criar um desequilíbrio óbvio e os custos do tratamento e distribuição da água vão ser muito superiores ao que a Câmara cobra por essa mesma água. Basicamente tiramos do sistema os clientes que mais pagam, protegendo os que mais têm, onerando todos os outros. Além disto, isto também irá criar um esgotamento dos aquíferos, menos água para todos os outros, poços esgotados especialmente a quem mais perto está. Algo similar acontece com os custos do saneamento, que está directamente relacionada com o consumo de água (não há contadores de esgotos instalados nas habitações).

Ao coeficiente entre o que gastamos com a "água" e o que recebemos, podemos chamar Grau de Recuperação de Custos. Se o que gastamos é igual ao que recebemos temos o valor 1 (100%). Se gastamos mais do que recebemos esse valor é menor que 1 e, no caso contrário, será maior que 1. 

A situação no Concelho de Nelas, segundo a ERSAR (Entidade Reguladora dos Serviços de Água e Resíduos) é particularmente desequilibrada. Para o ano de 2019, último ano com dados disponíveis, o grau de recuperação de custos é de apenas 45%, ou seja, a CMN gasta mais do dobro a comprar e distribuir água, do que aquilo que cobra a quem a vende. Para o saneamento a grau é ainda mais baixa, 42%. Existe pois já um desequilíbrio que, em princípio, fará aumentar o custo da “água”. 

Ora por aqui podemos ver qual será a tendência quanto ao custo da "água" num futuro próximo. Mas há mais um “detalhe” que poderá agravar muito mais tudo isto. A CMN, nos últimos anos e fruto dos fundos comunitários disponíveis, praticamente oferecidos às CM, candidatou-se e viu aprovados um conjunto significativo de projectos, cuja a eficiência confirmaremos no futuro, mas que a avaliar pela “Grande ETAR de Nelas” que ainda antes de inaugurada já tinha problemas de construção (e parece que a população de Beijós também não a acha grande obra), poderemos ter no futuro problemas. Estes projectos que, no Ciclo Urbano da Água, representam em oito anos um investimento de quase 7 milhões de euros e uma comparticipação de 5,7 milhões de fundos comunitários, como se pode ver na tabela seguinte retirada do site do Portugal2020.

Tanto investimento são boas notícias, certo? Pois depende. Depende da forma como gastamos o dinheiro, quem são os verdadeiros beneficiários das obras feitas e depende igualmente se honramos os compromissos que assinamos quando vamos buscar o dinheirinho. 

E que compromissos vêm a ser esses? Nestes programas os beneficiários ou cumprem ou comprometem-se a ter um grau de recuperação de custos de 0,8 a 0,9, ou 80 a 90%. Não cumprindo as operações passam a não elegíveis e o dinheirinho pode ter de ser devolvido. Portanto ou a “água” pode subir e muito (falta saber se para todos ou, novamente só para alguns (veja o parágrafo do tarifário lá atrás)), ou há o risco de terem de entrar de repente uns milhões de euros nos cofres da CMN para devolver. Ora há por aí empresas como as Águas de Qualquer Coisa, que estão sempre prontas para juntar mais concelhos ao seu portefólio e depois poder praticar preços tipo os que se praticam no Carregal do Sal. É até uma estratégia mais ou menos velada dos governos, homogeneizar estas questões, fazer na "água" o que acontece na energia eléctrica. Houve até quem já tentasse privatizar a água, como sabemos.

Talvez seja por isso que, este ano, pela primeira vez, a CMN contratou por 5.000€ uma empresa, com a justificação de “ausência de recursos próprios” para fazer algo que todos os anos os seus funcionários faziam – o reporte à ERSAR dos dados relativos à “água” e que determina também o tal cumprimento deste e de outros parâmetros. 

Mas que tudo isto sejam apenas uma possibilidade que não se verifique. Será melhor para todos, naturalmente. Não digam é que não foram avisados. 

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Prudência

Recentemente foi anunciado um investimento de 53 milhões de euros numa nova empresa na Zona Industrial de Nelas. Ao que parece a empresa irá transformar plástico em combustível. Algo “inovador a nível europeu”, uma das primeiras empresas na Europa a testar esta solução. Tudo isto foi anunciado com pompa e circunstância, com fundos comunitários às toneladas e o que é costume nestas ocasiões. Tudo apresentado como um tremendo trunfo eleitoral, como é óbvio. 

Mas a empresa, que já mudou de denominação e de sede em apenas três meses de existência – começou por ter sede num escritório de advogados com relações privilegiadas com o presidente de Câmara, para depois a mudar para um lote da ZI de Nelas, onde adquiriu terreno a 50 cêntimos o metro quadrado, bem abaixo do preço do mercado (há quem lhe chame dumping e diga que é uma prática também ilegal). Esta empresa serviu antes para mais um golpe de teatro, tendo sido posto a circular que se iria instalar nos terrenos da ex-CPFE (aqueles que em 2017 foram perentoriamente “vendidos” à CM de Nelas, só que nunca o foram) mas, grande problema, afinal aquilo está tudo contaminado e “teve de ir para Nelas”. 

Façamos de conta que tudo isto aqui já relatado não é suficientemente grave para, num país que preza a decência e a legalidade, ser investigado à bruta pelas entidades competentes e fixemo-nos na outra parte do problema, o que há-de vir, que pode muito bem ser (a repetir-se o padrão mais comum) em prejuízo de todos para lucro de alguns. É anunciado que uma empresa que investirá 53 milhões de euros (vamos dar de barato que é esse o valor), portanto de grande dimensão, se vai instalar numa zona industrial a poucas centenas de metros do centro urbano de Nelas e de outras povoações e onde trabalham diariamente muitos trabalhadores e o que sabemos sobre a empresa é exactamente o quê? O que é que nos foi transmitido, nós que vivemos aqui, sobre:
  • O processo produtivo;
  • As quantidades de matérias primas;
  • Os produtos rejeitados líquidos e gasoso;
  • O armazenamento;
  • O transporte;
  • Os riscos associados;
  • Os resultados da avaliação de impacto ambiental;
  • Onde é que se pode consultar a dita avaliação;
  • Quando é que foi feita a consulta pública relativa ao processo de licenciamento que, cálculo eu, uma empresa com um volume de investimento como o anunciado deveria ter. 
Alguém tem resposta para alguma destas questões? É que eu procurei e não vi (admito que possa existir). Pode a população do Concelho aceitar de ânimo leve qualquer investimento (ainda por cima um “inovador” e “pioneiro na Europa”, que nos devia levar a questionar, por prudência, a razão de ser feito aqui e com suspeitas de podem existir interesses financeiros atrás aduzidos) que surja sem ter conhecimento cabal do que realmente se pretende produzir? Podemos ficar-nos com a esperança e a confiança de que tudo irá correr bem, como fizemos na pandemia com o #vaificartudobem e depois, olha, paciência? E se assim não for (e esperemos que tudo seja uma maravilha)? É que, ainda por cima, isto parece ser um “projecto de interesse nacional”, um PIN, como foi, por exemplo o FreePort em Alcochete.


Era por isso desejável que mais informações fossem dadas a todos, que fossem cumpridos os preceitos legais de avaliação ambiental antes das certezas da instalação, para que o direito de todos e a saúde publica e o ambiente do Concelho sejam respeitados e para a que a confiança de todos nas instituições não se degrade para ser pasto para oportunistas. E, já agora, trata com a mesma celeridade e prontidão com que se colocam máquinas a sinalizar novas vias e rotundas, da requalificação ambiental dos Fornos Elétricos, um risco para a saúde pública do outro Concelho da União dos Concelhos de Canas de Senhorim e Nelas. Ou não basta a Urgeiriça para nos ensinar que estes problemas, reais ou potenciais, podem ter impactos sérios, como doenças e morte de concidadãos, daqui a uns anos?

Mas que tudo corra pelo melhor. 


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