Incerteza na Covercar?

Em Maio do ano passado, com o aparato habitual nestas situações, foram inauguradas as novas instalações da Covercar. Empresa presente no concelho de Nelas há anos, em instalações arrendadas e que, fruto de vários apoios e da autarquia de Nelas, construiu um novo pavilhão na Zona Industrial da Ribeirinha em Canas de Senhorim. 

Aquando do contacto da empresa com a CM de Nelas, era eu vice-presidente (lugar que só ocupei mais meses), foi requerido à Autarquia que fosse cedido terreno a 0.5€/m2 (política costumeira há mais de uma década) e, como os havia , fiz tudo para que os terrenos cedidos fossem em Canas de Senhorim. Isto para que, de uma vez por todas, se acabasse com o estigma de que em Canas não há condições para instalar empresas (algo que só a Officelan tinha ousado contrariar). Esta instalação só foi possível porque , na altura, outra empresa se iria instalar em Nelas – AzurMetal, apaziguando os sentimentos primários de centralismo que todos conhecemos. 

Foi na presença do Ministro das Infraestruturas, de deputados da Nação, presidentes de Junta, líderes políticos e outros biblots que os setenta funcionários começaram a produzir para a Auto Europa, capas e outros componentes. 


Já antes disso o presidente da Câmara tinha, quase unilateralmente, decidido sobre a terraplanagem e outras benesses a atribuir à empresa com a qual o seu escritório de advogados tinha (tem?), alegadamente, uma avença de prestação de serviços jurídicos. Esses trabalhos de movimento de terras, até foram alvo de uma queixa crime por parte de Manuel Marques pois, segundo este, foram feitos sem qualquer procedimento concursal importando em mais de 300 mil euros. A isto devemos somar, pelo menos, os custos de instalação de um posto de transformação de energia, que, espante-se, foi, alegadamente, montado às expensas de todos nós e não da empresa e, ainda, um contrato de apoio à contratação que implica, se não me engano, a manutenção de postos de trabalho por um período de três anos. 

Quase 170 trabalhadores dão o seu melhor para fornecer os produtos para o palmelão T-Roc mas pelos vistos grande parte destes cidadãos poderão ir para o desemprego. Ao que parece (andam para aí uns rumores que já foram até "noticiados"), ultrapassados que estão constrangimentos em Marrocos, o grosso da produção vai alegadamente ser para lá deslocalizada com a consequente perda de postos de trabalho no concelho. Enquanto isso não acontece há relatos de imposição de condições de trabalho pouco éticas, como 12 horas de trabalho por dia, Sábados, Domingos e Feriados, bem como alteração de planos de férias - o que terá já levado a que alguns tenham avançado com processos em tribunal. 

Neste momento alguém poderá estar a estudar a redução em cerca de 70% dos postos de trabalho (120?) e a transferência da produção para África. Esperemos que, de alguma maneira, isso não corresponda à verdade e não chegue a ser concretizado. Mas para tal seria importante, entre outras coisas, questionar e denunciar esta possibilidade. Não deixa de ser curioso que da parte da Autarquia não haja qualquer manifestação pública de preocupação com o assunto e os postos de trabalho ameaçados. Houve avultado investimento de dinheiros públicos que pode ir pelo ralo abaixo e poderá haver eventual incumprimento dos compromissos protocolados. A relação próxima entre o presidente da Câmara e a empresa não permite equacionar a possibilidade de este desconhecer a situação. 

Ou será que outras relações laborais se irão sobrepor, uma vez mais, ao interesse comum e público? Seria conveniente que os que se apressaram a estar presentes na inauguração agora, pelo menos, levantassem publicamente questões sobre esta situação e procurassem inteirar-se sobre todos os contornos (mesmo o mais nebulosos).

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Monopolizar

É de alguma forma recorrente, surgindo amiúde na comunicação social, a questão da competitividade das empresas e dos trabalhadores portugueses. Curiosamente por estas bandas, quando vertida à nação em jeito de espectáculo, é sempre servida como um problema dos trabalhadores e nunca da responsabilidade de outros contextos. É-nos invariavelmente garantido que é preciso trabalhar mais pelo mesmo dinheiro, ganhar menos, reduzir direitos, olhar para o enquadramento internacional, etc., e tal, whiskas saquetas. 

Estranhamente em climas mais friorentos, nas margens do Reno, o IG Metal, poderoso sindicato tudesco, conseguiu recentemente um aumento de 4.3% dos vencimentos e um alivio das horas de trabalho. Um dia tais ventos soprarão na Arrábida. 

Continuando, noutro dia acordei (literalmente) com a notícia de que a Citröen de Mangualde ameaçava deslocalizar a maior empresa do Distrito de Viseu caso os critérios de classificação dos veículos para efeitos de portagem não fossem revistos. Exige a empresa que a classe classe um possa acomodar um novo modelo que por lá será – com excelente qualidade, tenho a certeza – produzido. À luz dos critérios actuais o tal veículo cairia na classe dois e, portanto, pagaria muito mais das excessivamente caras portagens portuguesas. Como eu já vi um episódio destes com um monovolume produzido para os lados de Palmela, já sei como o filme acaba – a classe um vai passar a incluir o veículo da PSA produzido em Mangualde. 

Devemos um agradecimento sincero a esta multinacional. Devemo-lo por nos demonstrar de forma clara o tipo de país e de sociedade em que vivemos. Com estes actos podemos compará-la com, por exemplo a Alemanha, onde um grupo de trabalhadores, devidamente associados e organizados, conseguiu o que atrás referi. 

É sempre refrescante relembrarem-nos que a nossa democracia (e sociedade) ainda tem muito que trilhar para se tornar competitiva em termos democráticos. Quando uma simples ameaça (bem vinda, note-se) de uma empresa, para que se baixem as portagens, tem mais eco nos decisores do que o bradar de diversas comissões de utentes e opiniões de cidadãos é sem dúvida revelador. 

Se há quem julgue que os custos das portagens minam os custos da produtividade do país, que contribuem para a sua desertificação e para uma doentia concentração na faixa costeira (com os custos ambientais que este Verão nos fez questão de espetar pelos olhos adentro), é porque não vêm o filme todo, não estão por dentro dos problemas, e são certamente, opiniões que não valem o tempo que gastamos a lê-las (caso não sejam opiniões de empresas poderosas, naturalmente). Tais como as aquelas que nos dizem que o preço da electricidade ou dos combustíveis, dos mais caros da Europa, não tem relação nenhuma com a dita produtividade. 

(Por falar em combustíveis sabia que o preço médio actual do gasóleo é de €1,35/l, quando há um ano era de €1,07/l e que o barril de Brent está mais barato do que em 2015.)

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Fixação com o Interior

Hoje, 18 de Janeiro, o Jornal de Notícias dá conta que as portagens voltam a aumentar e, admire-se quem quiser, estas aumentam mais nos troços que servem as regiões mais interiores de Portugal, quando comparadas com as do litoral. 

Podíamos, fôssemos pouco atentos ou mal intencionados, dizer que, mais uma vez, o Governo (este, aquele, etc.) está mais uma vez a ceder aos interesses das empresas privadas concessionárias que para atingirem um lucro de que não abdicam, e como há menos carros a circular, têm de aumentar o valor unitário da passagem na infraestrutura. Podíamos até dizer que a retórica frequentemente utilizada de que agora é que vamos discriminar positivamente as regiões do interior é uma treta, que as estruturas de missão para o interior não serviram para nada, que os discursos ouvidos depois dos dantescos incêndios eram vazios, que os investimentos públicos mais relevantes se centram sempre na capital do país ou na capital do Norte deixando aos restante país migalhas que não invertem (como poderiam?) o abandono populacional do interior e o deixam para pasto livre das chamas. Podíamos mas temos de ser mais optimistas e ver para além do óbvio. 

Todos sabemos que as estradas tanto servem para trazer pessoas como para as levar e o que provavelmente se pretende com esta medida é tornar mais caro e, consequentemente, difícil, a saída de pessoas do interior e, assim, evitar o êxodo de populações, ajudando-as a fixarem-se nos locais que ainda habitam. Esta medida é também uma forma de seleccionar visitantes, excluindo os financeiramente menos abonados, que visitam o interior mas poucas divisas nos legam. Temos portanto de louvar e agradecer esta iniciativa que, pese embora incompreendida, serve para proteger o interior. 

Outra medida que devemos (mas esta devemos mesmo) aplaudir é a intenção de criação de “cabras-sapadoras” para limpar as faixas de gestão de combustível de forma ecológica. Em tempos falou-se de “cabras-bombeiras” para o distrito da Guarda mas, infelizmente, estas nunca foram operacionalizadas. Agora, quem sabe se com recurso aos fundos comunitários, estas cabras foram objecto de formação profissional e foram reconvertidas de “bombeiras” para “sapadoras” e, caso avancem, irão traçar esses montes e ainda nos poderão deliciosos queijinhos.

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"Racionamento de Guerra"

O peculiar presidente da Câmara Municipal de Nelas, farol da “violência psicológica”, brindou-nos esta semana com inflamadas declarações sobre a seca extrema que atravessamos, fenómeno deveras preocupante e que nos deve fazer a todos reflectir.

Tomando a dianteira – talvez amuado por não aparecer a ladear o Ministro do Ambiente ou
o Presidente da República em recentes visitas à Barragem de Fagilde – alarmou o país com a sua ignorância ao declarar que era preciso declarar (ou que tinha declarado?) o “Estado de Emergência”, pois a situação “já o era” e “apenas faltava uma assinatura no papel”. Basta uma simples consulta à Lei 44/86 para entender o porquê de os autarcas de Mangualde, Penalva e Viseu se terem demarcado de imediato destas declarações. Exige que o Presidente da República aja mas ainda não declarou o Estado de Alerta que depende dos órgãos a que preside. 

Mas este alarmismo não é coerente com as acções recentes deste peculiar edil – talvez assomado de algum pequeno sentimento de culpa que o leva a tentar sacudir alguma água do seu capote e assim minorar o problema. 

Hoje no Público as suas reais preocupações e prioridades vieram ao de cima, tal qual azeite (ou outro qualquer poluidor menos denso) na água – “Está a ver o que é uma empresa ligada ao sector automóvel parar por falta de água?” – Aqui está a prioridade das preocupações do autarca que, pese embora todo o respeito que nos possa merecer, não pode, de todo, ter a prioridade da acção da autarquia. 

Diga-se que a empresa referida gasta mais de 500 mil metros cúbicos diários de água (correspondendo a mais de 1/3 de todo o consumo do concelho) mas que obtém água dos aquíferos locais, fornecida pela própria autarquia a preços muito inferiores aos de qualquer munícipe (seria interessante aferir se esses aquíferos estão a servir para injectar água na rede pública ou, como é usual e ao arrepio das normas da ERSAR, continuam a abastecer a tal empresa). Uma empresa que “resolveu” o seu problema com os efluentes – em vez de apostar cabalmente no tratamento e reutilização da água que consome – o que onera todo o ambiente em especial nestas alturas críticas – descarregando no colector municipal, que por sua vez descarrega na Ribeira da Pantanha, ajudando a destruir o ambiente e milhões de metros cúbicos de água no Rio Mondego. Uma empresa que curiosamente pagava ao jurista que agora é presidente da Câmara. 

Quando se ignora ou secundarizam propostas para a reabilitação de alguns depósitos inactivados por falta de manutenção ou para o levantamento cabal das infraestruturas de abastecimento e rejeição de água, quando se considera que reabilitar o sistema de tratamento de águas residuais passa por cobrir de brita nova um conjunto alargado de fossas sépticas em povoações que deviam ser ligadas a uma rede servida por ETAR, podemos bradar contra a falta de água de qualidade? Pelos vistos, sim. 

O Ministro do Ambiente quando indica(va) o Município de Nelas como exemplo por ter encerrado as suas piscinas municipais (era interessante ver-se realmente todas as razões que levaram a desse encerramento) talvez não se devesse esquecer de todas as acções da Inspecção Geral do Ambiente, da Agência Portuguesa do Ambiente, da situação lamentável em termos ambientais que se verifica neste município, nos milhões de euros de dinheiro público que vão ser empatados para resolver problemas privados e do papel que a anterior Secretaria de Estado do Ambiente teve. Talvez fosse interessante transmitir a todos os portugueses que ajudar a destruir os recursos hídricos nunca pode ser considerado um bom exemplo. Se se informasse antes de voluntariamente dizer asneiras talvez não se arrependesse mais tarde, como já foi o caso, e o “racionamento de guerra” não fosse preciso.

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Risco Sistémico

Nos últimos anos, anos pré-troika incluídos, fomos bombardeados com notícias de bancos com problemas e da necessidade imperiosa de os “salvar” pois, caso não o fizéssemos, corríamos um sério “risco sistémico”, um tremendo “risco de contágio”, a toda a economia, que seria destruída. Esse discurso e essas políticas levaram a que fossem “injectados” – assim tipo fármaco milagroso – mais de quinze mil milhões de euros (ou talvez bem mais), nessas empresas criminosamente geridas, para proveito de uns quantos privilegiados. Isto sem que ninguém até hoje, quase uma década depois do início, tenha sido verdadeiramente condenado e pago por este regabofe. São mais de mil quinhentos euros por cada português transferidos. Dinheiro pago que permitiu estilos de vida imorais, comprar decisões políticas, etc… Dinheiro que serviu para branquear má gestão e “salvar” empresas e acionistas que ainda enchem a boca e páginas de jornais, com o discurso liberal hipócrita, de menos intervenção estatal.


Dou comigo a pensar que é uma pena que os decisores não enveredem, no caso dos incêndios e da desertificação do interior do país, por o mesmíssimo discurso do “risco sistémico”. Que bom seria para a economia, a coesão territorial, a coesão nacional, os radicalismos políticos, a desertificação, etc., que as mesmas razões fossem defendidas e a intervenção do Estado fosse similar à que foi no caso da banca.



Que bom que era que o que tivesse ardido fossem herdades de Ricardo Salgado, de Granadeiro ou Zeinal Bava, de Rendeiro ou de Horácio Roque. Que bom que era que tivesse sido a herdade da Coelha ou a de Dias Loureiro. Seriam os mesmíssimos 520 mil hectares de território nacional – deixemos os mortos de fora que são coisas demasiado sérias para fazermos aqui trocadilhos irónicos – e seríamos seguramente todos muito mais generosos para recuperar essas áreas e essas economias. É o passado recente que o comprova. Assim, como não foram, a coisa será bem mais modesta. E como lembra a nossa maior “popstar” – o que nunca fez no caso da banca – neste caso temos de nos preocupar com o défice.

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Ordenamento

Já aqui falei da responsabilidade colectiva que todos temos e que não pode ser desvalorizada no caso dos dramáticos incêndios florestais que este ano ultrapassaram todos os limites. Mas falemos de outros.

Durante os últimos quase todos os Planos Directores Municipais, instrumentos basilares do ordenamento territorial do país, foram revistos. Nas comissões responsáveis por acompanhar esses importantes documentos têm assento o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas e a Autoridade Nacional de Protecção Civil, entidades com particulares responsabilidades na área dos riscos e, muito concretamente, nos incêndios florestais.

Basta consultar muitas das actas das reuniões de acompanhamento para entender a relevância que muitas autarquias dão/davam à questão dos riscos, da protecção civil e da segurança dos seus concidadãos, quase sempre catalogadas com uma fitinha azul, como se estivesse numa urgência hospitalar com triagem de Manchester.

Não será surpresa supor que nestas reuniões se verificava o recurso os argumentos, de alguma validade, de que as disposições do Decreto-lei 124/2006, que regula a defesa da floresta contra incêndios, eram disparatados e exagerados, que as “tolas” exigências – como, por exemplo, ter de haver à volta de qualquer edificação em espaço rural e num raio de 50 metros, uma área sem carga combustível significativa – impediam o desenvolvimento económico e não eram justificáveis. Não se pode invocar que basta que bombeiros tivessem acesso ao local – não aceitando que estas disposições servem para protecção das infraestruturas quando não há bombeiros. Não se pode defender ser insensato haver uma faixa de contenção de 100 metros em redor das zonas industriais porque os custos e a propriedade não o comportavam.

Isso levanta um problema de coerência e falta de memória quando os que antes desvalorizavam essas questões agora se queixam da ANPC, do Governo ou de quem quer que seja, e que também cometeram falhas (longe de pensarem quais seriam as consequências, naturalmente).

A falta de rotina trágica, com poucas situações verdadeiramente dramáticas, desleixa naturalmente estes assuntos e a análise colectiva a estes é tentada a remete-los para o infortúnio, tão característica na mitologia judaico-cristã, quer nas causas, quer nos efeitos. Esta falta de prioridade é também reflexo de há muito não termos em terra pátria uma agressão militar, como em quase toda a Europa, que obrigava os seus cidadãos a uma organização pessoal metódica e à consciencialização de que a sua acção pessoal – a dirigir-se para abrigos, por exemplo – pode fazer toda a diferença. Mas neste Verão sofremos muito provavelmente a pior agressão desde o terramoto de 1755 ou das Invasões Francesas. As coisas terão obrigatoriamente de mudar.

Nos últimos dias os partidos políticos que apoiaram parlamentarmente o anterior governo têm criticado a Protecção Civil, criticas essas maioritariamente justas e isso só pode servir para nos dar alento. É que Passos e Cristas, ao fazerem essas criticas estão igualmente a criticar-se a si próprios e as políticas que seguiram. Não posso acreditar que apenas criticam a mudança de lugares dirigentes porque isso é algo que é feito há décadas e, admito algum esquecimento, o mais relevante que fizeram no governo foi precisamente mudar pessoas. Essas criticas são, objectivamente e por imposição legal, criticas também à Protecção Civil municipal, base de todo o sistema e, pelas razões anteriormente elencadas, pouco valorizada. São, portanto, criticas a governos locais da responsabilidade dos seus partidos. É sinal, quero acreditar, que também as palas que muitos usam, também arderam nos últimos incêndios. É portanto um primeiro passo para assumirem os seus próprios erros – depois de elencarem os do Primeiro-ministro, da Ministra da Administração Interna, do Presidente da ANPC e do Comandante Nacional – e para se criar o consenso nacional necessário para mudar realmente as coisas.

Que a discussão que agora se iniciou também sirva para trazer para o topo das prioridades, nos fogos mas não só – cheias, sismos, barragens, emergência médica, etc, a preocupação com a segurança dos cidadãos por parte de quem nos governa.

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A Culpa Também é Nossa

Portugal ardeu. Portugal ardeu em condições meteorológicas tão extremas que nem os que arduamente lutam contra o fogo conseguem grande coisa. A situação é tal forma dantesca que não é humano combater estes monstros. Ainda assim há quem tente, arrisque a vida, se esforce para trazer conforto aos que sofrem. Ainda assim há quem o consiga. 

Há demasiados anos que ouço dizer que é preciso investir em prevenção. Certo. Quem não
concorda? Há demasiado anos ouvimos ser preciso investir numa estrutura profissional de combate – e de socorro pré-hospitalar em todo o país, já agora – que dê uma resposta rápida e profissional, com condições que as exigências actuais evidenciam, às solicitações cada vez mais frequentes. 

Vejo pessoas a pedir bombeiros, bombeiros que não existem para tanta solicitação. Bombeiros que fazem dessa actividade um hobby e que fazem verdadeiros milagres. 

Quem tem os pés assentes na terra sabe que com as alterações climáticas e com a floresta que temos não será possível não ter incêndios problemáticos. Culpa-se o governo, o presidente da Câmara e da Junta mas raramente as nossas próprias culpas. 

Culpa-se o vizinho, o cão, o gato, os bombeiros, mas escapa-nos a responsabilidade individual. E nem é das limpezas à volta da casa, da empresa, da mata, que se trata. 

Há cada vez menos gente a inscrever-se em bombeiro, a tornar-se sócio das Associações de Bombeiros. 

Poucos são os que exigem a quem governa, localmente ou centralmente, que gaste mais do nosso dinheiro em protecção civil, em prevenção, ou a exigir a profissionalização dos bombeiros. Quantos criticam o facto de muitos orçamentos municipais terem mais dinheiro atribuído a clubes de futebol, que o gastam para pagar a jogadores, do que para prevenção e combate a incêndios florestais? 

Vejo poucas pessoas a não gostarem do facto de se gastarem milhares e milhares de euros em festas de entrada gratuitas, “Tonys Carreiras”, feiras e mercados, enquanto para evitar o que todos os anos sabemos pode acontecer, é gasto muito menos. 

Gasta-se em segurança pública para proteger claques de futebol ou para celebrar “aparições divinas” na Cova da Iria, que nem servem pelos vistos para granjear as boas graças dos “todos poderosos”. 

Vejo poucas pessoas a insurgirem-se com o facto de se darem apoios pornográficos a empresas privadas, alguns ilegais, em vez de se criarem sapadores florestais, de se darem apoios para plantar espécies adequadas ao nosso clima e solo. 

Quase todos validamos estas escolhas, legitimas diga-se, ao votar em quem sistematicamente as prefere e propõe e depois achamos que a responsabilidade não é nossa. Mas é! Quando passarmos a ser mais exigentes com a forma como gastamos o nosso dinheiro as coisas seguramente melhorarão. Quando deixarmos de desculpa corrupções, aldrabices, “Sócrates” e “Isaltinos”, as coisas vão melhorar. 

Um autarca que, antes desta tragédia, propusesse cortar no dinheiro do futebol, por exemplo, e dá-lo aos Bombeiros, seguramente que seria alvo de fúria pública. Por essa razão é que as prioridades são, o que são. Porque nós, enquanto sociedade assim o desejamos. Não culpem, portanto, só o autarca ou o governo, culpem o vosso querido e precioso umbigo.

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