Prudência

Recentemente foi anunciado um investimento de 53 milhões de euros numa nova empresa na Zona Industrial de Nelas. Ao que parece a empresa irá transformar plástico em combustível. Algo “inovador a nível europeu”, uma das primeiras empresas na Europa a testar esta solução. Tudo isto foi anunciado com pompa e circunstância, com fundos comunitários às toneladas e o que é costume nestas ocasiões. Tudo apresentado como um tremendo trunfo eleitoral, como é óbvio. 

Mas a empresa, que já mudou de denominação e de sede em apenas três meses de existência – começou por ter sede num escritório de advogados com relações privilegiadas com o presidente de Câmara, para depois a mudar para um lote da ZI de Nelas, onde adquiriu terreno a 50 cêntimos o metro quadrado, bem abaixo do preço do mercado (há quem lhe chame dumping e diga que é uma prática também ilegal). Esta empresa serviu antes para mais um golpe de teatro, tendo sido posto a circular que se iria instalar nos terrenos da ex-CPFE (aqueles que em 2017 foram perentoriamente “vendidos” à CM de Nelas, só que nunca o foram) mas, grande problema, afinal aquilo está tudo contaminado e “teve de ir para Nelas”. 

Façamos de conta que tudo isto aqui já relatado não é suficientemente grave para, num país que preza a decência e a legalidade, ser investigado à bruta pelas entidades competentes e fixemo-nos na outra parte do problema, o que há-de vir, que pode muito bem ser (a repetir-se o padrão mais comum) em prejuízo de todos para lucro de alguns. É anunciado que uma empresa que investirá 53 milhões de euros (vamos dar de barato que é esse o valor), portanto de grande dimensão, se vai instalar numa zona industrial a poucas centenas de metros do centro urbano de Nelas e de outras povoações e onde trabalham diariamente muitos trabalhadores e o que sabemos sobre a empresa é exactamente o quê? O que é que nos foi transmitido, nós que vivemos aqui, sobre:
  • O processo produtivo;
  • As quantidades de matérias primas;
  • Os produtos rejeitados líquidos e gasoso;
  • O armazenamento;
  • O transporte;
  • Os riscos associados;
  • Os resultados da avaliação de impacto ambiental;
  • Onde é que se pode consultar a dita avaliação;
  • Quando é que foi feita a consulta pública relativa ao processo de licenciamento que, cálculo eu, uma empresa com um volume de investimento como o anunciado deveria ter. 
Alguém tem resposta para alguma destas questões? É que eu procurei e não vi (admito que possa existir). Pode a população do Concelho aceitar de ânimo leve qualquer investimento (ainda por cima um “inovador” e “pioneiro na Europa”, que nos devia levar a questionar, por prudência, a razão de ser feito aqui e com suspeitas de podem existir interesses financeiros atrás aduzidos) que surja sem ter conhecimento cabal do que realmente se pretende produzir? Podemos ficar-nos com a esperança e a confiança de que tudo irá correr bem, como fizemos na pandemia com o #vaificartudobem e depois, olha, paciência? E se assim não for (e esperemos que tudo seja uma maravilha)? É que, ainda por cima, isto parece ser um “projecto de interesse nacional”, um PIN, como foi, por exemplo o FreePort em Alcochete.


Era por isso desejável que mais informações fossem dadas a todos, que fossem cumpridos os preceitos legais de avaliação ambiental antes das certezas da instalação, para que o direito de todos e a saúde publica e o ambiente do Concelho sejam respeitados e para a que a confiança de todos nas instituições não se degrade para ser pasto para oportunistas. E, já agora, trata com a mesma celeridade e prontidão com que se colocam máquinas a sinalizar novas vias e rotundas, da requalificação ambiental dos Fornos Elétricos, um risco para a saúde pública do outro Concelho da União dos Concelhos de Canas de Senhorim e Nelas. Ou não basta a Urgeiriça para nos ensinar que estes problemas, reais ou potenciais, podem ter impactos sérios, como doenças e morte de concidadãos, daqui a uns anos?

Mas que tudo corra pelo melhor. 


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